28.8.07

Peça: 36. ...

Esta breve narrativa foi escrita alguns anos atrás numa oficina de contos da qual participei com alguns amigos. O exercício nos obrigava a escrever pequenos trechos narrativos que fugissem um tanto de nossas tendências naturais. Aí vai o resultado que muito me divertiu à época.

“Não vou botar minha boca aí”, eu disse para ele. E disse assim mesmo, na lata, na cara dele. Ele ficou sem ação, tentou me segurar pelo braço, mas me livrei. Ele insistia, dizia que ia ser bom, que eu levava jeito e que isso ia fazer de mim uma menina mais interessante. “‘Menina’ um caralho”, eu gritei. Gritei e saí correndo, sem olhar para trás. Corri. Corri muito. Pensei que ele fosse me alcançar, que fosse me empurrar para eu cair de cara no chão. Eu chorei até. Não sou de chorar, mas eu chorei. Nessa hora eu chorei. Ficava me lembrando daquela coisa imunda e dele me pedindo, mandando, botar a boca, assoprar, com força. Imundo. Eu corria mais ainda. Tinha a sensação de que ele ia me alcançar. Quando cheguei perto da praça fiquei mais tranqüila. Olhei para trás e ele não estava. Não tinha a certeza de que ele tivesse me seguido, mas eu o sentia perto de mim, correndo. Sentada no banco da praça, sobre o sovaco branco do cristo, me lembrei daquele negócio. Eu não ia botar a boca naquilo jamais, nem morta. Decidi naquela hora, ali mesmo, na praça, que eu só tocaria piano: isso de saxofone é coisa para quem não tem higiene.

15 comentários:

Moacy Cirne disse...

Pô, cara, todo o seu talento já aparece por inteiro, ou quase, nesse "exercício". O final é muito bom, sim, mas, por outro lado, se não fosse desse modo, todo o conto perderia parte de sua força. Resumindo: valeu a pena divulgá-lo. De verdade. Um abraço.

Anônimo disse...

Quando eu li, tomei um susto! Pensei "Que troço será?". Também achei engraçado.

Beijo!

ReOl

Theo G. Alves disse...

Moacy,
obrigado pela atenção e pela generosidade que você sempre me oferece.
É sempre um motivo pra continuar este museu.

Um grande abraço!

Theo G. Alves disse...

Becca,
tenha medo não: essas coisas acontecem :D

Ótimo sempre ter um sinal seu!

Beijo!!

Anônimo disse...

sobre o sovaco branco do cristo é de se imaginar que a lembrança nos remeta para cada coisa... inclusive para o aquilo que melhor nos faça (rss...) bela escrita, theo. ah, e asseadinha a menina, não? grande abraço.

Theo G. Alves disse...

grande pardim!

aqui temos um cristo com sovaco, rapaz. nossa mania pequena de querer ser o RJ inaugurou um Redentor aqui em 1937 :)
em baixo do sovaco do cristo as pessoas se reúnem. eu, durante um tempo, também encontrava meus amigos por lá.

E deve-se sempre desconfiar de gente asseadinha assim, né?

Um abraço, meu amigo!

Wescley J. Gama disse...

Théo, meu caro, como testemunha daquelas oficinas de conto (coordenadas pelo Aldenir), só tenho a dizer que esse foi um belo e engraçado momento daquelas noites agradáveis.
Grande Abraço.

Sônia Marini disse...

Muito divertida sua narrativa. Fecha com chave de ouro, no seu bate-bola com o Pardim. rs abraços

Theo G. Alves disse...

wescley, meu velho,
o momento daquela oficina foi todo muito divertido e muito proveitoso.
bons tempos, bons tempos!

grande abraço





sônia,
bom vê-la de volta! muito obrigado pelas palavras gentis. E qualquer frase do Pardim é sempre uma chave de ouro.
abraço!!

Anônimo disse...

Ficou muito engraçado! E confesso que pensei em tanta coisa, menos num saxofone.

Esse mundinho blogueiro é minúsculo... Eu costumava ler e comentar o Centenário, era um dos meus blogs favoritos... Decidi reativar meu blog e procurar o pessoal das antigas, e não é que te encontrei? Perdi o link meses atrás, mas felizmente consegui recuperá-lo.

Prazer em relê-lo!

Ada
(adalfs@hotmail.com)
(www.meninagauche.blogger.com.br)

dade amorim disse...

Que conto delicioso, Theo!
Ando com saudade de você, que some e não diz quando volta.
Tenho um blog de poemas agora:
www.inscries.blogspot.com
Um beijo e boa semana.

Bruno Capelas disse...

Olha eu aqui pensando besteira , caro mestre. :D

Abração!

PS: Mut needs a maid.

Marco disse...

Rá! Rá! Rá!... muito bom! Clap! Clap! Clap!... eis um autor teatral despontando! Excelente, Theo. Carpe Diem. Aproveite o dia e a vida.

Anônimo disse...

Nossa, me acabei de rir aqui... até chamei meu namorado e li pra ele rir também.
Nós já com pena da pobre menina, achando que algum garoto queria... vc sabe,... rs
mas não... ilário.

Theo G. Alves disse...

Ada,
que bela surpresa! há muito tempo não tinha notícias suas... e que bom que você reativou o blogue e que conseguiu reencontrar este velho centenário, que agora é museu de todas as coisas...

seja sempre bem vinda!

grande beijo!



Adade,
também tenho sentido saudades... tenho andado meio longe do mundo dos blogues últimamente... a vida é complicada e tira a gente pra longe do que se gosta... mas cá estamos e aluta é diária... gostei muito da novidade do blogue de poemas e vou lá conferir...

beijo bem grande!!



Salve, Mut!

controla esses pensamentos aí, rapaz ehehehehehehehe

needs a maid? who fix your meals and go away? :)

grande abraço, mano!!



Salve, Marco!

essas histórias de boca no trombone sempre dão o que falar! ehehehehe

abraço!



Olá, Rosana!
que bom que a estorinha te divertiu... e compartilhar essas coisas "eróticas" pode ser salutar eheheheheh

seja bem vinda!

abraço