23.11.07

Peça: 39. Outra Página Avulsa de Um Caderno de Viagem

Dia sem número terceiro

Meu olhar por estas terras já não mais parece o de um viajante breve, cujos olhos se aplicam momentaneamente sobre tudo o que lhe é passageiro, efêmero.

Creio minha bandeira fincada sobre estas serras e imagino suas cores e estrelas desbotadas e seu corpo tem a forma de uma minha camisa rota e suja de sangue, redesenhada pelos anos e amargores dos dias: minha bandeira morta.

Verdade é que pensei em deixar esta cidade, mas desconhecia novas rotas de partida e havia esquecido a rota que me trouxera até aqui. Este caderno há de um dia apontar-me os caminhos por onde possa deixá-la, eu sei.

17.11.07

Peça: 38. Para Se Inventar Um Homem Só

lentamente
abandona tuas roupas
deita-as
peça
por
peça
sobre o chão

o piso de gelo
sob
teus pés:
como os dedos finos
da morte gelada
lhe tocam o ombro
lentamente

teu corpo
masculino
e
imperfeito
diante do espelho
é silêncio:
tua voz esquecida

tua musculatura
de pedra
frágil
arqueja ante os
relógios:
tua casa
em ruínas

abandonados
tuas roupas
teu corpo
tua voz
ergue a casa
de teu calar
de tua ausência

ninguém dirá:
não morras -
hoje não.

4.11.07

Peça: 37. Outra Paisagem Currais-novense

Aproveito a abertura da exposição do artista plástico currais-novense Adriano Santori, cujo título é Imagens de Currais Novos, para trazer esta fotografia minha sobre a cidade:

o peso
das toneladas infinitas de scheelita
sob as ruas

o peso mineral
das toneladas mais infinitas ainda
sobre a cidade

pelos currais
arrastamos suas pedras:
sobre/sobra a cidade natimorta