27.11.06

teu riso escasso -
penumbra de catedrais -
te veste por fora
e o silêncio das ruas
é tua casa
por dentro

1.10.06

Museu de Tudo: Serviços


Para os bons amigos que tanto se dedicam à leitura, o Museu de Tudo traz a indicação do ótimo Estante Virtual, sítio que reúne sebos e livreiros de todo o Brasil. O sítio fornece informações acerca dos acervos e livreiros de maneira fácil, além de diversos mecanismos de busca.

Os preços também são um atrativo interessante.

A dica me foi passada anteriormente pelo Mut, da famosa Padoca do Mutante (link aqui ao lado).

Encontre o sítio Estante Virtual em www.estantevirtual.com.br

21.9.06

Exposições de Tudo: Cinema e Belas Mulheres

Dois belos filmes para duas belas mulheres


A Doce Vida, de Federico Fellini, com a bela Anita Ekberg.





Duas belas mulheres em dois belos filmes

Dogville, de Lars Von Trier, com a bela Nichole Kidman



A beleza muitas vezes não me deixa dormir.

31.7.06

Exposição: Jards Macalé no Movimento dos Barcos

Sem muito a dizer. Caiu em minhas mãos, hoje, esse lindíssimo disco, estréia de Jards Macalé, de 1972. E como falam da tal angústia da influência, para minha surpresa, publico um poema meu ao lado de uma bela letra de Capinam... para me matar de inveja...

Um disco absolutamente perfeito. Maiúsculo. Esse deve ser discografia básica de cada cidadão neste mundo.

Jards Macalé – Jards Macalé (1972)
1 Farinha do desprezo (Capinan - Jards Macalé)
2 Revendo amigos (Jards Macalé - Waly Salomão)
3 Mal secreto (Jards Macalé - Waly Salomão)
4 78 Rotações (Capinan - Jards Macalé)
5 Movimento dos barcos (Capinan - Jards Macalé)
6 Meu amor me agarra & geme & treme & chora & mata (Capinan - Jards Macalé)
7 Let's play that (Jards Macalé - Torquato Neto)
8 Farrapo humano (Luiz Melodia)
9 A morte (Gilberto Gil)
10 Hotel das estrelas (Duda - Jards Macalé)


meu amor me agarra & geme & treme & chora & mata (jards macalé-capinam)

meu amor é um tigre de papel
range, ruge, morde
mas não passa de um tigre de papel
numa sala ausente meu amor presente
me esconde entre os dentes
depois me abandona e vai definitivamente
definitivamente volta ilude desilude
range ruge rosna
velho tigre de virtudes

nas selvas de seu quarto entre florestas cartas
frases desesperadas lençóis
onde me ama
furiosas garras
meu amor me agarra & geme & treme & chora & mata
um tigre de papel perdido no lençóis da casa


os tigres de papel

o meu poeta
é um menino que
recorta tigres de papel –
sempre a aparar arestas
que geram
arestas – e as apara
apara-as muitas vezes –
vê-las surgir
sempre

o meu poeta
é um menino que
amputa versos –
como quem arrancasse as patas
de seu tigre de papel –
sempre a aparar arestas
que geram
arestas – e as apara
apara-as muitas vezes

o meu poeta
é um menino
sempre a aparar arestas
que geram
arestas – e as apara
apara-as muitas vezes –
até ver surgir
seu tigre ínfimo
quase impossível.

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Para mais, sobre este disco e Jards Macalé, acesse o sítio oficial do Jards Macalé

Infelizmente não consegui fazer o carregamento da capa do disco para cá... mas há de passar... dêem uma olhadinha no sítio do Macalé. Para a página principal, clique aqui.

20.7.06

messias

sozinho
ele está despido
no deserto

escreveu seu coração
na areia
para não carregar a angústia
pétrea de seu medo
até os últimos dias

quando o povo vier ao seu encontro
ele fugirá
para mais longe ainda
continuará despido e


sozinho
ele estará despido
no deserto

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Este museu tem estado abandonado, relegado à poeira e a um breve esquecimento. Mal lembrava-me a última vez em que estive aqui. Trago então este poema - queria dizer "que tem a forma do teu seio", como escreveu Quintana - frágil, rápido, feito da lama que ainda resta do barro de que sou feito. Volto melhor em breve, sobretudo, para revisitar os amigos. Grande abraço.

Hoje, sem fotos.

7.5.06

Peça: 26. Uns Dias de Chuva*

Nos dias de chuva - dias raros por estas bandas do mundo - o tempo me enche de uma melancolia levemente doce e tranqüila. Nos dias de chuva, essa é uma delicadeza ancestral. Quase um poema do Mario Quintana que viesse se repetindo durante inúmeras gerações, à maneira de uma Macondo sem sofrimentos e contemplativa, onde a ação é algo mais interior e poético, usurpado brandamente de baús muito antigos, feitos à mão.

Nos dias de chuva por estas bandas, ainda que não haja chuva, todos os homens são mais homens que machos. Nos dias de chuva por estas bandas, ainda que não haja chuva, todas as mulheres adquirem um ar de doçura triste que lhes dá um tom ainda mais próximo dos sonetos de Shakespeare.

Por estas bandas, quando o céu está dormindo pesado sobre nossas cabeças, quando o sol está arrefecido e a água parece mais que nunca uma bênção sem um deus exato e milimétrico, tenho a sensação real, tão real e nítida, de que sob essa melancolia dos rostos, sob a beleza dessa luz inesperada que o dia toma, sob a tranqüilidade e os encantos das crianças nas ruas, todos nós somos mais felizes. Tenho a sensação de que eu sou mais feliz, por mais que não o seja.
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Texto publicado há um par de anos em "O Centerário"

22.4.06

Peça: 25. Uma Primeira Lembrança


- para o velho Mut

Hoje algumas de minhas primeiras lembranças me afligem e me alegram brevemente, como toda lembrança.

Relembro a imagem de Deus ao tocar meu ombro e dizer, quando adormecia o dia: "descansa, Adão, descansa".
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A foto, como já se sabe, é detalhe da Criação de Adão, de Michelanguelo

13.4.06

Exposição: B. H. in Satin


Lady In Satin - Billie Holiday (1958)

Há dias em que se ouve música para se estar. Outros há em que se ouve para acompanhar as horas. Mas há dias em que se ouve a música porque ela é tudo o que nos resta, tudo o que somos.

Em dias como estes, como este, Billie Holiday vestida em cetim é mais que suficiente. É providencial. Ainda mais: é perfeita.

Lady in Satin foi gravado em 1958. Deveria ser ouvido pelo menos uma vez por dia de lá até aqui.

Tenho certeza de que nenhum coração humano pode ouvir canções como I Get Along Without You Very Well, Violets For Your Furs, But Beautiful, etc. sem estremecer a cada palavra que desliza pela garganta sagrada da Ms. Brown to me. Lady Day canta com a delicadeza de quem passa a lâmina gentil sobre seus pulsos: e você gosta. E quer mais, não recusa.

Faixas:

1. I'm A Fool To Want You
2. For Heaven's Sake
3. You Don't Know What Love Is
4. I Get Along Without You Very Well
5. For All We Know
6. Violets For Your Furs
7. You've Changed
8. It's Easy To Remember
9. But Beautiful
10. Glad To Be Unhappy
11. I'll Be Around
12. The End Of A Love Affair


But Beautiful
por Johnny Burke / James van Heusen

Love is funny or it’s sad
Or it’s quit or it’s mad
It’s a good thing or it’s bad

But beautiful
Beautiful to take a chance and if you fall, you fall
And I’m thinking I wouldn’t mind at all
Love is tearful or it’s gay
It’s a problem or it’s a play
It’s heartache either way

But beautiful
And I’m thinking if you were mine
I’d never let you go
And that would be
But beautiful
I know
Love is beautifull
I know


* Há ainda uma versão remasterizada deste disco com faixas bônus, de 1997.

Mais fotos no Museu de Tudo no multiply

5.4.06

Peça: 24. Trecho de uma conversa ouvida entre porões sem esquecimento

- Diremos que se matou porque era um fraco.

- Ninguém acreditará.

- Diremos que se matou para não delatar seus comparsas.

- Ninguém acreditará.

- Diremos então que se matou para proteger a família.

- Mas ninguém acreditará.

- Então diremos que se matou e só. Depois confiemos na força das armas que nos escondem e do profundo murmúrio silencioso que sai destes porões.

- Ninguém acreditará, mas é isso o que faremos.

E, verdadeiramente, ninguém acreditou.

20.3.06

Peça: 00 A Poeira Sobre Estas Peças

A poeira sobre estas peças é a pedra da fundamental deste breve museu. Ela está sobre tudo mesmo antes de seu primeiro piso, de meus primeiros alumbramentos. A poeira deste museu é anterior à matéria de que são constituídas estas peças. Anterior ainda ao tempo, a Deus, quem sabe.

Desde minha primeira manhã por estas bandas, percebo que o tempo é imenso e que sua ausência é ainda maior e mais profunda. Uma terra em que os dias não se medem pelos calendários, em que cada um decide o dia em que está e, por isso, todo dia é sempre o mesmo e sempre outro.

O coração dos relógios está parado nestas terras. Não de hoje. De antes. Muito antes. Os galos que anunciam as manhãs cantam ainda indistintamente sem saberem ao menos que dia anunciam: lembram malmente os acordes de suas cornetas matinais. Cantam por hábito, mais que por ofício.

Por isso tanta poeira sobre estas peças. Tanta poeira sobre os relógios. Tanta poeira sobre estas terras.

5.3.06

Peça: 23. Um Silêncio Germinado

Vejo nascer um silêncio de dentro para dentro, mais dentro ainda; profundamente. E a boca vai devorando por fora o rosto que a sustenta, alimentando-se do corpo, não para o corpo. Saciada, devora a boca a boca; engole-se. Devora a si mesmo e põe-se miúda, miúda como um universo retraído que não se expandisse nunca. A boca condenada ao silêncio.

Sem voz alguma, percebo que a distância maior para dentro do mundo que alcanço é a longitude de meu braço estendido através das grades por onde assisto à vida. Desejo tocar o mundo mais adiante e não o alcanço: minha alegria e minha discórdia. Desejo o mundo que não tenho e a alegria do universo que é meu, estas grades que me cabem, afunda minha carne dolorida na angústia de exigir o inalcançável.

Nascido o silêncio em mim, percebo que a vida não aconteceu ontem à noite, que não acontece agora e que amanhã já não será. A vida, o mundo, são todo o tempo todo o tempo: sempre. Mas a boca devorada já não dirá uma palavra que possa ser decifrada.


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Algumas explicações: o tempo tem sido um tanto cruel comigo nestas últimas semanas, culpa destes dias muito pequenos, cheios de horas muito miúdas. Por isso tenho visitado tão pouco os visitantes tão estimados deste museu, ou até mesmo respondido particularmente a cada comentário, como é hábito por aqui. Tenho esperanças de que o tempo volte a rodar da maneira certa por aqui. Quanto aos comentários, me esforçarei mais para poder respondê-los prestamente.
Um abraço.
Theo
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a foto é de uma cena do belo Tão Longe, Tão Perto, do alemão Wim Wenders, sempre presente neste museu

24.2.06

Peça: 22. Paisagem Ouvida Entre a Matriz de Sant’ana e os Currais

4 horas:

dobram
sinos
dobram
sinos

na igreja matriz
e no pescoço das cabras:
que se assombram
no cio.


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Na foto, centro de Currais Novos em 1937. Quae tudo mudou, mas pouquíssima coisa está diferente. Coisas destas terrras. O fotógrafo, infelizmente, é desconhecido.
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Este é um post dedicado especialmente a alguns amigos com quem converso, vez em quando, a respeito desta peculiar Currais Novos. Entre eles: Fabio e Ana Ulanin, Moacy Cirne, Anne Frichenbruder, Marcos Pardim, Milton Ribeiro

10.2.06

Peça: 21. Trecho da já conhecida história de Cido Marinheiro

Dizia sempre que nesta vida, neste mundo, não havia lâmina melhor que a sua, que entrasse mais rente, que saísse mais limpa. Dizia que, de tão afiada, sua faca cortava um homem ao meio e esse ainda vivia mais dois três dias sem saber que se desconjuntava o de baixo do de cima.

Tinha essas coisas de homem brabo, de cabra-da-peste: era fulano mordedor. Sangue de jagunço, eu acho. Eu sei. Por estas bandas todos havemos de ter um traço de jagunçaria no corpo ancestral, nos galhos da árvore de linhagens.


Cido Marinheiro era o homem da lâmina. Manuseava a faca como um mágico de feira: seus movimentos eram circo de lâminas. Dizia que era cigano também. Não lia mão, não sabia do futuro de ninguém, senão do seu: fácil saber o futuro de quem não tem futuro algum, de quem é feito só de hojes, de ontens.

Cido Marinheiro me ensinou o circo das facas; a escola delas como chamou João. Cido era um homem só lâmina, era sua essência como essência de faca é só lâmina só. Cido era marinheiro e nem conhecia mar, nem daqui nem de lonjuras. Cido Marinheiro era um engodo, senão pelo que das facas sabia: era lâmina, só lâmina. Cortava gentes pelos caminhos, deitava orelhas de homens grossos nas feiras potiguares.

Cido era só lâmina. Era o sangue de jagunço. Sangue de cigano não tinha mesmo. Não lia mão, não roubava, tomava a bênção e morava no mesmo chão desde o nascimento seu. Era o sangue de jagunço. Homem destas bandas tem parte com jagunçaria, seja em que tempo, seja que homem. Mas o jeito de Cido com a faca, isso não se vê de muito por aqui nem por aí. Cido era só lamina, só.

Meu pai, ele também era Cido. Mais eu era seu filho que fosse ele meu pai. Entendi sempre que sua voz, assim como sua faca, ordenava as coisas em minha casa, casa de meu pai. Pouco usei meu nome em meu tempo, era O Filho de Cido Marinheiro, nome demais para um menino só: uma existência de cada vez é o que se necessita, o que se deve.

Quase em nada Cido meu pai me deu ensinamento. O manejo da faca aprendi só e em segredo, que minha mãe proibia o uso de corte para arte, senão pelo trato da carne. Cido Marinheiro nunca me desvendou o segredo da melhor empunhadura: aprendi no sangue, pelo sangue, que o sangue nas veias de Cido meu pai era o mesmo das veias de seu filho, das minhas. Antes de aprender a falar, antes até do primeiro choro, a minha lembrança mais antiga é a do cabo da lâmina nas mãos: a empunhadura. Como um brinquedo vermelho, uma esperança de outra cor eu me lembrava dela; a faca é meu primeiro espelho. Mais do que me ver, eu estava nela.

A manobra da lâmina está no sangue dos meus, coisas da jagunçaria, jagunçagem, como João Rosa ensinava a chamar. Soube sempre que sangue de ciganos eu não tinha, mas também mentia. Dizia que eram artes das Índias, manuches, coisas do povo que inventou o andar para frente, o parafuso e a alma de quem vive, de quem morre: o que é quase o mesmo. Entanto, verdade era a de jagunço, sangue de quem faz tocaia, de quem morre em tocaia.

Na casa de meu pai nada houve, jamais, que me pertencesse. A casa era sua, a comida só cabia na boca à chegada de Cido Marinheiro à mesa, mesmo minha mãe não era minha: era antes a mulher de Cido. Também ela não tinha nome, senão esse. Não tínhamos. Éramos quase todos feitos de silêncios por dentro e por fora, só as histórias de Cido faziam som em nossa casa. E Cido meu pai não contava histórias, não era disso: as histórias é que o contavam: verdade em quase tudo, o que não era ainda verdade é porque se demorava a acontecer: gente é feita de muitas metades nestas terras.
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in A Casa Miúda

4.2.06

Peça: 20. Flores para um funeral

A sala está escura e mal se podem ver dois homens: um está sentado e cabisbaixo, o outro deitado sobre a mesa.

A porta abre-se subitamente e outro homem acende a luz. Prontamente o que estava sentado levanta-se e apaga-a. Diz irritado:
- Por favor, não acenda esta luz.
- Desculpe-me, mas é que tudo estava tão escuro...
- Sim. Estava e ainda está. Por favor, mantenha-a apagada e não fale alto. Não percebe que o homem está morto? Convém não incomodá-lo.

O homem que acendera a luz logo se ajoelha ao pé da mesa que mal pode enxergar, prostra as mãos e reza. O outro o repreende erguendo-o.
- Não faça isso, senhor. Já lhe pedi para que não incomode o morto.
- Eu estava rezando apenas.
- Ele está morto. Não percebe que seu ranger de dentes de nada lhe vale?
- Me desculpe... apenas pensei...
- Diga-me: para que pode servir uma reza a um morto?
- Não sei, senhor. Ao certo, não sei.

Os dois sentam-se. Um continua na cadeira, com o novo companheiro sentado a seu lado, no chão negro e frio da sala. O outro está deitado ainda sobre a mesa.

Depois de um longo silêncio, ele pergunta:
- De que morreu este homem?
- Isso faria alguma diferença?
- Não sei, senhor.
- Apenas não o incomodemos. Isso já é suficiente.
- Quando ele acordará, senhor?
- Ele está morto.
- E não acordará por isso?
- Não lhe parece um motivo razoável?
- Talvez...

O homem levanta-se de sua cadeira, arrasta alguns móveis na sala ainda escura. Pega pela mão seu novo companheiro e pergunta serenamente:
- O que se faz quando se está vivo?
- Ora, senhor... que estranha pergunta...
- Pode me responder?
- Senhor, quando se está vivo se está vivo e só...
- E que grandes feitos há nisso?
- Eu não sei ao certo...

Diante da ansiedade de seu companheiro, o homem toca-lhe o ombro, ao que diz:
- Calma. Venha até aqui e deite-se sobre esta mesa. Não se preocupe: não deixarei que acendam a luz.
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Foto do Duane Michaels, como sempre

22.1.06

Peça: 19. Trecho de Um Caderno de Viagens

Mal cheguei à cidade e meus olhos já se cansaram como os de Adão, ao fim do primeiro dia. Os corpos se multiplicam ao longo das ruas, empilhados como o entulho das construções mais recentes. Não estão mortos ao certo.

No entulho das gentes, mulheres e crianças choramingam a morte pouca e a vida escassa. Os homens não reclamam. Embora também não aceitem. Permanecem calados como sempre viveram.

Uma mulher depositou numa das pilhas infinitas de gente, trinta, talvez trezentos mortos, um par de moedas opacas. Depositou-as e deitou-se sobre os outros. Tinha a esperança de que o Barqueiro Sombrio aceitasse a barganha. Mas não aceitará, eu sei.
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A foto é novamente de Nabor Kisser

15.1.06

Peça: 18. Um Homem Em Chamas

um homem em chamas
não acorda a cidade
como
uma bomba
ou
um relógio

um homem em chamas
ateia fogo à casa vazia
como a
um calabouço
ou um deserto

um homem em chamas
faz silêncio
e seu couro
duro
desmancha o fogo
silencioso

um homem em chamas
dorme desfigurado
como
um cão
ou
uma lembrança morta
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foto de Lee Lanier
Vá também ao Museu de Tudo no Multiply

9.1.06

Ainda os 10 Melhores de 2005 - 3. My Morning Jacket – Z

Z é o quarto álbum da banda de Louisville, Kentucky, nos Estados Unidos, My Morning Jacket. Os vocais de Jim James são parte do motivo que alçam o disco Z ao terceiro lugar desta lista. Porém o MMJ é muito mais que isso: uma boa linha de contrabaixo (Two-Tone Tommy), ótimas guitarras (Jim James e Carl Broemel), o bom acompanhamento dos teclados (Bo Korster) e uma bateria muito bem acertada (Patrrick Hallahan) conduzem o som do disco Z à uma fluência encantadora que vai de riffs roqueiros como Lay Low à vocalizações maravilhosas como as de Wordless Chorus.

O MMJ vem mantendo os mesmos padrões de qualidade musical desde seu disco de estréia Tennesse Fire, de 1999. Depois disso já vieram At Dawn (2001), It Still Move (2003) e neste ano Z. Qualquer lista de melhores de qualquer um desses anos deveria contar com a presença do MMJ.

É bom prestar atenção no solo de Lay Low, que revela algumas das influências da banda e na belíssima e delicada Knot Comes Loose, que me remete diretamente à músicas como Through My Sails, de Neil Young (no disco Zuma, de 1974).

Knot Comes Loose:
“b.b. can't you see that i'm smiling???
can't you see - there's a part of me that's brand new???
used to be - was a part of me felt like hidin - but now it comes thru!
deep in my heart - that's where the knot comes loose.”

Faixas:

1. Wordless Chorus

2. It Beats 4 U
3. Gideon
4. What A Wonderful Man
5. Of The Record
6. Into The Woods
7. Anytime
8. Lay Low
9. Knot Comes Loose
10. Dondante

Gravadora: ATO/RCA Records
Data de lançamento: 04/10/2005
Mais informações: http://www.mymorningjacket.com

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Na foto a capa de Z

4.1.06

Peça: 17. A Paisagem Íntima Destas Ruas

Foi diante de nós. Já nada havia a ser feito. Estavam mortas e o corpo fatídico das ruas enternecia a cidade.

Cada pedra secular destas ruas é feita de silêncio ancestral e solidão. A solidão que endurece as pedras mais macias.

Estavam diante de nós. Eram o corpo silencioso das ruas.

Nada foi dito e continuamos nossa caminhada nesta procissão de silêncios.

Eram o corpo silencioso das ruas. Já estavam mortas antes mesmo de nascer o tempo ou Deus, eu sei.


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Foto de Nabor Kisser

2.1.06

10 Melhores de 2005 - 2. Arcade Fire – Funeral


Relutei em classificar Funeral, do Arcade Fire, entre os melhores do ano por uma razão das mais simples: Funeral foi lançado originalmente em 2004, porém só chegou ao Brasil neste ano, juntamente com a passagem da banda canadense pelo Tim Festival. Mas a verdade é que gosto tanto deste disco que arranjaria quaisquer justificativas para ajuntá-lo nesta lista.

O Arcade Fire é dessas novidades que surgem na música e que, mesmo sem grandes divulgações ou concessões, consegue espalhar seu som por boa parte do mundo. Me arriscaria a dizer que o Arcade Fire não cairá na mesma armadilha em que caíram bandas como Coldplay, que depois de um belíssimo disco de estréia caíram nas tediosas repetições. Verdade é que o AF nada tem a ver com o Coldplay.

Funeral é um disco ambíguo, no melhor dos sentidos: toda sua dose de sarcasmo e tristeza é compensada com um som pulsante e generoso, com letras intrigantes e um tanto sádicas.

Não se contagiar ouvindo este “Funeral” é missão quase impossível.

Neighborhood #4 (7 Kettles)
“I am waitin’ ’til I don’t know when,
cause I’m sure it’s gonna happen then.
Time keeps creepin’ through the neighborhood,
killing old folks, wakin’ up babies just like we knew it would.

All the neighbors are startin’ up a fire,
burning all the old folks the witches and the liars.
My eyes are covered by the hands of my unborn kids,
but my heart keeps watchin’ through the skin of my eyelids.”

Faixas:
1. Neighborhood #1 (Tunnels)
2. Neighborhood #2 (Laika)
3. Une Annee Sans Lumiere
4. Neighborhood #3 (Power Out)
5. Neighborhood #4 (7 Kettles)
6. Crown Of Love
7. Wake Up
8. Haiti
9. Rebellion (Lies)
10. The Backseat

Gravadora: Merge Records
Data de lançamento: 14/09/2004 (lançamento oficial; o disco só chegou ao Brasil em outubro de 2005)
Mais informações:
www.arcadefire.com
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Foto do Arcade Fire/divulgação